Hoje no Brasil, 29 de janeiro, é dia da Visibilidade Trans. Mas qual é a razão da data? Visibilidade quer dizer chamar a atenção, garantir que algo ou alguém seja visto e reconhecido, enfim, tornar visível. Trans é a abreviação para transexual, travesti, travestilidade, transexualidade, transgênero. Consistem nas pessoas que reivindicam sua identidade, subvertendo as normas de gênero estabelecidas pela genitália.
Assim, é necessário repensarmos essas regras, na medida que nem toda menina gosta de boneca, nem todo menino de bola, nem toda mulher tem vagina, nem todo homem tem pênis. Pois não é a nossa genitália que nos faz homem ou mulher, e sim a forma como nos comportamos na sociedade, é o modo de vestir, o tom da fala, vários sinais que emitimos do corpo para que as pessoas nos percebam como queremos ser reconhecidos. Afinal a gente não precisa sair vendo pintos e bucetas por ai para distinguirmos quem é homem e quem é mulher!
Dito isso, voltamos à pergunta inicial, por que chamar a atenção para as pessoas trans? Vários são os motivos: o Brasil é o país que mais tem assassinatos de pessoas LGBT’s (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais) do mundo, uma pessoa a cada dois dias – e vem aumentando; a mínima parcela de pessoas trans no mercado formal de trabalho; a evasão escolar dessas, e como relacionamos essas pessoas à prostituição. Tudo isso em razão do preconceito, seja do mercado de trabalho, seja do Estado por não possuir leis e reconhecer seus direitos, seja o nosso próprio preconceito.
Muito desse preconceito se manifesta quando há a necessidade de identificação da pessoa, fato muito tranquilo para homens e mulheres biológicos. Mesmo que me chame Xênia, sendo um nome pouco comum, é feminino tal qual a minha aparência. Entretanto, quando uma pessoa trans possui o mesmo nome, mas se apresenta como um homem, se inaugura uma sequência de perguntas, olhares e dúvidas.
É comum às pessoas transexuais quando apresentam a documentação serem questionadas se os documentos são delas mesmas, se não são roubados, além dos olhares medindo cada centímetro para encontrar qualquer indício que comprove que ainda naquele corpo exista a verdade biológica, de que aquilo que vemos não é um homem de “verdade”, uma mulher de “verdade”. Mas, ora bolas, quantas mulheres e homens conhecemos das mais variadas formas, com peitos diferentes, pequenos ou grandes, com barbas diferentes, ralas ou fechadas. Nem mesmo a verdade biológica é capaz de abarcar toda a diferença que existe entre homens e homens, mulheres e mulheres, até mesmo em familiares, o pai fisicamente é diferente do filho. Não fosse o documento de identidade, que atesta o diverso daquilo que a pessoa travesti ou transexual é de fato, a diferença se resumiria a peitos pequenos ou grandes, barbas ralas ou fechadas.
É na apresentação da identidade que se concretiza o preconceito. É o momento de não ser chamado para uma entrevista de emprego, de ser impedido de embarcar em um avião, de ser vítima de chacota e violência no ambiente escolar, no banco, nos postos de saúde, e em todos os espaços onde identificar-se é necessário.
Por isso, é urgente estabelecer uma política de respeito e reconhecimento de direitos das pessoas trans, que o direito ao nome e ao próprio corpo sejam efetivamente protegidos, seja através de legislação específica ou ainda através de decisões judiciais sensíveis à dignidade das pessoas trans.
Só para terminar, e não encerrando o assunto, é muito comum quando pensamos em pessoas travestis e transexuais que nos venha à mente a mulher peituda e bunduda, porém, é necessário afirmar que nesse mundo de diversidade (e como é importante sermos diferentes e únicos) há muito homens travestis e transexuais, pessoas que se vestem como homens, comportam-se como tal, tem barbas ralas ou fechadas, estão por aí, querem ser respeitados e devemos respeitá-los, pois afinal todos somos gente, dignos de amor e respeito.
Agradeço gentilmente o espaço cedido pela Natália Mendes, e quem mais contribui ao blog, aos amigos Marcelo Caetano e João W. Nery pelas fotos, ainda ao Transgrupo Marcela Prado pelo contínuo aprendizado. A vocês o meu carinho.
Xênia Mello, capricorniana, advogada feminista, pesquisadora sobre Transexualidade e Direito, voluntária no Transgrupo Marcela Prado em Curitiba.
Esse texto faz parte da Blogagem Coletiva promovida pelo Blogueiras Feministas
Veja também:
Do manicômio à UnB – por Marcelo Caetano
“Tabu América Latina – Mutação Sexual”
É isso aí, que os direitos das pessoas de ser o que elas querem e serem respeitadas em suas escolhas exista sempre e em todas as situações. Meu voto de apoio à causa, saudações.